Quando bebo com minha mãe, ela se atualiza e eu me enraízo

Quando minha mãe vem visitar, abasteço a geladeira de IPA. A Magda é hop head total. Mas, claro, nem sempre foi assim. Quando eu era criança, ela dizia que gostava de Brahma, porque era a mais amarga.

Quando comecei a escrever sobre cerveja, sempre que encontrava minha mãe ela era obrigada a experimentar muita IPA e ouvir muita história. Só mãe mesmo para aguentar tagarelice sobre lúpulo, escolas cervejeiras e notas disso e daquilo.

Foi assim que descobrimos que a Magda, minha mãe, é hop head. Foi assim que ela descobriu que adora o rolê cervejeiro, no clima taproom e food truck. Aí eu fico brava, bufo, falo que estamos engatinhando no Brasil, que nos EUA as cervejarias são ambientes super agradáveis para receber famílias. E ela faz aquele silêncio paciente que é a especialidade das mães.

Não sei você, mas pra mim, quando quero um tempinho com minha mãe, o encontro é na mesa. É o equivalente adulto do "posso ficar na sua cama?". Escolho cervejas legais, descolo comida boa e faço de tudo pro papo durar horas.

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Ela conta um monte de história, eu conto pra ela que não pode mais usar algumas palavras, e assim entre memória e momento, ela se atualiza e eu me enraízo. Ela prova as sours, aprende sobre barrel aged e torce o nariz pras RIS. De tanto cheirar cerveja, se meteu a ir estudar vinho e hoje à noite tem aula online de análise sensorial. 

Moderna, ela, né? É. Se você perguntar, aposto que ela vai dizer que ficou assim de tanto andar comigo. E é claro que meu filho vai achar essa conversa ridícula porque pra ele a gente não tem nada de moderna. Mas vai chegar o dia em que o Tomé vai aparecer com uma bebida que amou e dizer: "- Mãe, prova isso!" Aí eu que vou ficar moderna para beber com ele.

Pro Dia das Mães, encomendei um kit de embutidos artesanais, com direito a patê en croûte, bem chique. Vou começar abrindo uma Alice, saison envelhecida em barril de vinho com flor de laranjeira e semente de coentro. Já sei que minha mãe comprou um vinho natural pra gente tomar juntas. Bem moderna a Magda. 

E você? Qual cerveja vai levar pra sua mãe neste domingo? 

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Obs. Comecei a escrever a coluna Só de Birra no Estadão quando voltei da licença de maternidade do meu primeiro filho. Agora que nasceu o segundo, troquei a coluna pela TRILHA. Fazer parte da TRILHA é um desdobramento natural de duas histórias: a minha com eles e a minha com cerveja. 

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Vou começar pela minha com eles. A TRILHA é minha vizinha, o lugar em que terminei muitas noites e o ponto de parada obrigatória depois das compras de hortifrúti. Mas, acima de tudo, é o lugar a que vou (ou a cerveja que escolho) para beber sozinha. 

As cervejas da TRILHA têm tanta coisa para dizer que dispensam companhia de carne e osso. Pra mim, que passo o dia inteiro às voltas com falar, escutar e escrever, é incrível ter esse refúgio acolhedor de perfumes surpreendentes, sabores intensos e texturas incríveis. 

Na minha história com a cerveja, eu já estava sentindo uma vontade de dar um passo para dentro. Sou movida a entusiasmo e depois de nove anos escrevendo sobre cerveja do lado de quem bebe estava precisando de novos ares. Estar ao lado de quem produz é revigorante e empolgante. E espero que na conversa que vamos ter por aqui eu consiga dividir esse entusiasmo que vem junto das descobertas que movem o dia a dia aqui na TRILHA.

Helô Lupinacci

Heloisa LupinacciComentário